segunda-feira, maio 21, 2007

BEETHOVEN - "Pela dor a alegria"

NOTA EXPLICATIVA
O texto abaixo foi publicado em duas etapas no período indicado - em março e em (maio) de 1995. A anotação em parenteses, significa que não tenho certeza absoluta do mês, visto que não disponho de cópia do exemplar da continuação do texto, por outro lado a editora - MUSAS, fechou suas portas.
Outras partes elucidativas deste texto foram escritas e publicadas pela Escola de Musica e Belas Artes (2000) em um livro de minha autoria intitulado: ASPECTOS HISTÓRICOS E GENÉRICOS DA FORMA SINFONIA. Este material é fartamente ilustrado com os exemplos musicais. Infelizmente não publiquei aqui esses exemplos por não saber como fazer. Não sou um experte em informática, e ainda não aprendi a maneira de publicar figuras dentro do texto, mas em breve aprenderei e reformurei este texto para que todos possam acompanhar com maior compreensão o texto abaixo.
Como sugestão, proponho que acompanhe a leitura deste texto com a partitura na mão, como indico o número dos compasso, será fácil achar os exemplo e assim melhor entender a estrutura dessa maravilhosa obra de Beethoven.

"Pela dor a alegria"
Nos tempos de Beethoven a composição orquestral não era igual à moderna. Os criadores da Sinfonia, tanto da escola de Mannheim, comoseus continuadores da escola de vienense, utilizavam unia orquestra reduzida, com características camerísticas, mas com uma pequena ampliação da orquestra utilizada no Concerto e na Suíte. Para tanto vale relembrar a sinfonia nascida em meados do XVIII século com Stamitz, Sammartini e Richter, entre outros, difere por sua forma da Suíte e do Concerto Grosso. De remanescente da suíte apenas mantinha-se o Minuete no terceiro movimento e as primeiro movimento adotava-se a forma Sonata, com sua exposição bitemática.
Após 1795, influenciado pela Sinfonia Londres de Haydn, Beethoven passou a integrar em sua orquestração este conceito clássico de orquestração. No entanto Beethoven. amplia esta visão sonora da orquestra, incluindo em suas obras a presença dos trombones, flautim e contrafagote (Sinfonias V, VI e IX). Na 9ª. Sinfonia, por exemplo, Beethoven dobra o numero de trompas para quatro. Esta abertura na orquestra abre novas prospectivas sonoras para os novos sinfonistas pós-beethovenianos. A sinfonia moderna deixou de lado as técnicas do Baixo Contínuo e do Concertino - instrumentos solistas acompanhados, sendo radicalmente substituídos por uma massa instrumental agrupados em famílias, baseado no diálogo orquestral, proporcionando um novo conceito sonoro.
Dentro desta nova perspectiva sonora, a 9a Sinfonia ê um grande marcoevolutivo na composição musical de sua época. Ela e a ultima sinfonia escrita por Beethoven, durante o ultimo período de sua vida, concluída em Fevereiro de 1824, possuindo dimensões excepcionais aliadas à união da voz humana à orquestra. O lapso de 12 anos que a separa da 8a Sinfonia - concluída em Outubro de 1812 - fazem desta um mundo à parte na musica de Beethoven, tornando-a com grande teor de dramaticidade e de elevado nível técnico instrumental e vocal.
É a partir de 1815, quando de sua surdez total, que se inicia o grande período composicional de Beethoven. Desta data ate sua morte em 1827, afirma-se brutalmente os veios de sua genialidade, fazendo-o subir e se refugiar nos píncaros da sua arte.
Na sua época, seus caluniadores levantavam uma grande questão: "como pode ma homem surdo compor alguma coisa?", mas e justamente desseperíodo que surgem as grandes obras de sua vida, senão vejamos;
Missa Solemnis, 9ª Sinfonia, Variações sobre um tema de Diabelli, todas obras primas da música universal.
Dentro dos planos de Beethoven, existia a idéia de escrever duas sinfonias: a nona e a décima, que seriam sinfonias de maiores proporções e diferentes, ambas, encomendadas pela Sociedade Filarmônica de Londres. Beethoven entusiasmou-se tanto com a idéia, que desejou visitar Londres, mas as circunstâncias de saúde o impossibilitaram. No entanto iniciou os primeiros esboços de suas sinfonias. Inicialmente a 9a Sinfonia seria puramente instrumental e a 10ª que se intitularia "Sinfonia Alemã", deveria unir coros à orquestra.
Segundo documentos encontrados por Nottebohm, em 1815 Beethoven játeria esboços do tema com a indicação de uma Fuga, que deveria integrar o Scherzo da 9a Sinfonia. Em 1816, já havia indicações desua primeira idéia do 1º movimento, seguindo-se outros esboças até1818. A 9a Sinfonia foi, portanto concebida em meio aos sofrimentose tristezas do maestro. Esta dor iria culminar, todavia com um finalde alegria.
Neste período outras obras envolvem o maestro, a grande sonata 0p. 106, as Variações sobre um tema de Diaballi Op. 120 e a Missa Solemnis, iniciada em 1818 e concluída em 1822, embora terminada tardiamente para os objetivos a que ela se propunha, que era a consagração como Arcebispo de Olmütz, o Arquiduque Rudolfo.
Ao retomar a composição, em 1823, muda radicalmente o plano de sua obra o ultimo movimento que deveria ser puramente instrumental agora receberá as vozes humanas, aproximando-se assim ao projeto inicial de sua 10a Sinfonia, quem sabe ate pressentindo que a 10ª Sinfonia jamais seria concluída.
Na sua infância, por volta de 1793, Carlota von Schiller, irmã do poeta Friedrich von Sehiller, recebeu uma carta do professor Fischenich de Bonn, que relatava a existência de um rapaz portador de um incrível talento musical e que era muito apreciado pelo Príncipe Elector, a ponto de o mandar estudar em Viena, para que pudesse estudar com Haydn. Nesta mesma carta o professor mencionava grande interesse de Beethoven em musicar os textos de Schiller "An die Freude".
Em diversas tentativas, Beethoven esboçou algumas idéias sobre os temas de Schiller, sem nunca concluir qualquer idéia. Musicalmente estas idéias não guardavam nenhuma relação com o atual tema utilizado na 9a Sinfonia. É curioso observar, que em 1808, na sua Fantasia para Piano, Coro e Orquestra, já se ouve o tema utilizado na 9ª. Sinfonia, alguns anos mais tarde.
Porque esse canto de alegria fascinou tanto o maestro por toda a sua vida? Foi tantas vezes projetado e outras tantas vezes abandonado, e que acabou culminando de figurar, justamente na sua ultima obra, coroando - o luminosamente nesta obra magnífica a 9a Sinfonia? A resposta a estas perguntas eu não possuo, mas parece irônico que Beethoven exalte a alegria, no momento de grande dor interior e ate dor física, senão vejamos: surdo, doente, sozinho, pobre, esquecido, sofreu cegueira por algum tempo. O silencio exterior faz com que o maestro possa irradiar importantes resplendores. Uma vez Beethoven escreveu: "Durch lieben Prende" (peIa dor a alegria). É um pensamento sublime colocado em ação. Nohl, comentou que o que mais surpreendeu em Beethoven, apesar de suas doenças e infortúnios, parecia irradiar alegria pura e espiritual, algo que vinha do fundo do coração.
Em Novembro de 1822, Beethoven recebeu da Sociedade Filarmônica deLondres, 50 Libras, para a conclusão do manuscrito da 9a Sinfonia, comprometendo-se a terminá-la no mês de Março de 1823, mas as calamidades sofridas pelo maestro atrasaram a obra. Em Abril de 1823, escreveu ao maestro Ries, lamentando não poder terminar a obra, visto ter sido acometido de forte conjuntivite. Tão logo melhorou das vistas, instalou-se em Baden, para com tranqüilidade escrever a obra. Apôs o verão de 1823 regressou a Viena tendo concluído os três primeiros movimentos, a partir daí até Fevereiro de 1824, concluindo a obra na sua totalidade. Logo após mandou copiar e enviando-a à Sociedade Filarmônica de Londres.
Um fato no entanto marca a estréia da obra. Foi apresentada em Vienaantes que Londres a pudesse ouvir.
Beethoven desejava que sua obra fosse apresentada pela primeira vez em Berlin, a tal ponto de ter enviado uma cópia autografada e com dedicatória ao rei da Prussia Friedrich Wilhelm III: "in tiefster Ehrfurcht zugeeignet von Ludwig van Beethoven - 125tes Werk. No entanto levada por vários admiradores, tais como o conde Lichnowsky, Czerny, Diabelli, o Barão Schweiger, entre outros, a obra foi apresentada em Viena dia 7 de Maio de 1824, com grande receptividade e entusiasmo peIo público vienense, alcançando proporções extraordinárias. Foi a apoteose e a consagração do gênio. Segundo consta, a vibração era tão grande, que no segundo movimento – Scherzo - desencadearam-se fortes aplausos que inibiram a apresentação da orquestra a ponto de ter que interromper a execução, para retomar logo após. Beethoven, estava sentado ao lado do maestro Umlauf, de frente para a orquestra, no momento da explosão das palmas, Beethoven estava to absorto na leitura da partitura, que não percebeu a interrupção do concerto, a ponto que o maestro Umlauf chamou a atenção de Beethoven para que pudesse perceber a manifestação pública. Ao terminar a obra, a mezzo soprano Ungher, que participava como solista, pegou o braço de Beethoven, voltando-o na direção da platéia, pelo menos para que pudesse contemplar a manifestação dos presentes, comovido agradeceu aos aplausos inclinando-se para a frente. Uma segunda apresentação em Viena foi programada, para o dia 23 de maio, no entanto sem grandes resultados, provavelmente por ter acontecido ao meio dia. Foram as duas únicas apresentações em Viena e em vida do autor.
Acredita-se que Beethoven teria solicitado autorização a Londres para essas apresentações.
A primeira apresentação em Londres, cuja Filarmônica havia encomendado a obra, somente foi ouvi-la a 21 de março de 1826, com relativo êxito.
A primeira publicação da sinfonia foi realizada por Schott em 1826.

A 9ª. Sinfonia está dividida nos seguintes movimentos:
I – Allegro ma non troppo, un poço maestoso
II – Molto Vivace
III – Adágio molto e cantabile
IV – Presto (final extraído do texto de Schiller “An die Freude”, para coral, e quarteto solistas).


Como é habitual no primeiro movimento das sinfonias, Beethoven também desenha sua obra na forma Sonata. É um movimento de extrema complexidade, aliada à sua extensão incomum, quando comparado com outras partituras da época.
Embora hajam quatro movimentos bem claros, podemos dividir a sinfonia basicamente em dois grandes grupos, o primeiro - instrumental e o segundo - vocal , assim disposto:


I - INSTRUMENTAL
1. Allegro ma non troppo, un poco maestoso
2. Scherzo, molto vivace: trio, presto
3. Adagio molto e cantabile
4. Recitativo, presto; allegro ma non troppo...
5. Allegro assai

II - VOCAL
1. Recitativo
2. Quarteto e coro: allegro assai
3. Solo de tenor e coro: allegro assai vivace; alla marcia
4. Coro: andante maestoso
5. Coro: allegro energico, sempre bem marcato...
6. Quarteto e coro: allegro ma non tanto
7. Coro: prestissimo

I MOVIMENTO: "Allegro ma non troppo, um poco maestoso"
O primeiro movimento, allegro ma non troppo, um poco maestoso, o mais longo dos primeiros movimentos, inicia-se por assim dizer, com um prólogo de 23 compassos. E desenhado na forma sonata, como era de costume.
Nas partes ouve-se um trêmulo em sestinas de semicolcheias pelos II Violinos e pelos Violoncelos, formando assim um duplo pedal com as trompas, que tocam o mesmo intervalo por 14 compassos, parecendo fixar a tonalidade em La. Já os I Violinos e as Violas dialogam entre si executando um ritmo entrecortado, que parece indicar o primeiro tema.
Este prólogo parece induzir a um mistério, primeiro porque inicia-se em pianissimo, num trêmulo, como já mencionei acima, passando a um crescendo culminando com um fortissimo ao seu final. As madeiras vão se incorporando aos poucos.
A tonalidade principal somente é notada definitivamente a partir do 15 compasso, surgindo assim o primeiro tema a partir do compasso 17.
O segundo tema, na tonalidade de Si bemol, é dividido em duas partes e é contrastante com o primeiro tema por sua tranqüilidade, surge a partir do compasso 74. Este segundo tema é mais melódico e ouve-se a partir das flautas, clarinetes e fagotes. A Segunda parte do tema deriva da anterior, igualmente apresentado pelas madeiras, no entanto acompanhado pelas cordas. Este acompanhamento, em primeiro lugar é com um tênue staccato arpegiado em uníssono e depois o mesmo efeito passa a ser alternado pelas cordas. Na base ouvimos um pedal apresentado pelas trompas.
O desenvolvimento inicia-se a partir do compasso 120. Os dois temas fundamentais são profundamente elaborados expondo as suas células rítmicas nas constantes modulações. Já a recapitulação inicia-se no compasso 160. Todo o material exposto é exaustivamente reapresentado, sempre com uma nova visão sonora.
A Coda inicia-se no compasso 427, estendendo-se por 150 compassos. Suas proporções correspondem às de um movimento de sinfonia completo. Quase todos os elementos conhecidos são reapresentados nesta quinta parte do primeiro movimento. Inicia-se com brusco piano com a apresentação do tema principal, desenvolvido a partir dos violinos, com determinados reforços ou imitações apresentados pelas madeiras.

II MOVIMENTO: (Scherzo)[1]. "Molto vivace - Presto - Molto vivace"
O mesmo acontece com as, Quarta, Quinta, Sexta e sétima sinfonias, o Scherzo, que um dos movimentos mais amplos, não leva a indicação de Scherzo.
Nesta sinfonia, Beethoven colocou o Scherzo no lugar do movimento lento.
Um Scherzo é em todos os aspectos, um movimento de dança, com todas as repetições habituais, Trio e o Da Capo, acrescido das pontes de transição. Uma curiosidade é a afinação dos tímpanos em oitavas, que dão um impacto rítmico e timbrístico no mínimo interessante.
Após uma pequena introdução de 8 compassos, onde se apresenta a célula principal com um pulo de oitava, inicia-se o movimento com uma fuga a cinco vozes relembrando o fato que primeiro Beethoven concebeu o tema como o sujeito para a fuga. No Trio continua o interesse contrapontístico com a combinação dos dois temas. O exemplo a seguir mostra parte do início da fuga, que se inicia com as cordas.
O início do segundo movimento vem com a incumbência de reafirmar a tonalidade original da sinfonia.
O segundo tema inicia-se no compasso 93, onde o tema em Do Maior é exposto sobre um pedal formado pela célula rítmica do primeiro tema.
A partir do compasso 159 percebe-se um processo constante de mutações tonais até chegar no Presto, compasso 412, onde há uma mudança de tempo em ritmo binário, passando pela coda do Scherzo. A partir deste momento inicia-se a preparação, ou seja uma introdução ao trio em fortissimo.
Após a introdução, que é formada por apenas 4 compassos e prepara a tonalidade de Re maior, inicia propriamente o trio. A primeira seção do trio, muito breve, de apenas 8 compassos é confiada às madeiras. Após a repetição, segue-se a segunda seção que se inicia com as cordas. Este novo tom de Do Maior em vez de criar uma tensão na progressão, sinalizando uma tonalidade contrastante, e que constitui normalmente o princípio fundamental da forma sonata, faz com que as tonalidades principais abordadas no início da exposição do primeiro tema se tornem sem expressão, fracas. Podemos perceber um último tratamento iconoclaste da forma sonata antes que Beethoven o abandone completamente ao final.
A coda final do Scherzo inicia no compasso 539, da mesma forma que se iniciou o Scherzo: são 8 compassos de introdução, aí surge toda uma recapitulação, com a fuga do primeiro tema confiada às cordas. No compasso 623 o segundo tema é novamente confiado às madeiras tendo como pedal a mesma célula rítmica do início do Scherzo.
Ao final da coda do Scherzo, Beethoven dá um indício de retorno ao trio, muda o tempo para binário e o andamento para Presto, assim como a mudança de tonalidade, passando-a para Re maior, como na primeira aparição do trio.
Nos oito compassos do trio final, as cordas apoiam a passagem confiada às madeiras com um pedal.
Para concluir, Beethoven interrompe bruscamente o trio final. Surge então uma cadência final de descarga fulminante com golpes de oitava, em uníssono e em ritmo binário.
Com relação à orquestração: como já dissemos antes, os tímpanos possuem uma função quase solista e estão afinados em oitavas, como já mencionei acima, efeito este não novo, pois o próprio Beethoven já tinha utilizado este recurso na sua oitava sinfonia, estes no entanto tem uma função tão importante quanto os demais instrumentos solistas, no desenvolvimento do motivo de oitavas. No trio em Re menor, os trombones fazem sua primeira aparição nesta sinfonia, afirmando a característica de um hino, inerente ao trio, que contrasta com a ferocidade de todo o Scherzo.
A primeira participação do trombone acontece na introdução do trio com o trombone baixo, que apenas reforça o pedal dos oboés e dos clarinetes. A outra aparição dos trombones acontece no compasso 475, com passagem confiada ao trombone baixo.

III MOVIMENTO: "Adagio molto e cantabile"
Este movimento apresenta uma originalidade de conter um andante dentro de um adagio, com o qual se contrasta por seu ritmo ternário. Este movimento combina originalmente as 5 variações na forma de Lied.
O tom principal é o Si bemol Maior, o sexto grau da tonalidade principal da obra.
Este movimento é construído em duas partes, como vimos acima. Na primeira parte temos a apresentação do primeiro tema cuja relação estrutural recai principalmente no contraste. O segundo tema, surge no andante moderato que também é composto por um conjunto de 5 variações.
O primeiro tema surge no primeiro violino após uma breve preparação de dois compassos, na tonalidade de Si bemol maior, em tempo quaternário.
O segundo tema surge ao final do adagio, no segundo violino e na viola, sobre um pedal dos violoncelos sobre a dominante "La" no andamento andante moderato com tempo ternário, localizado a partir do compasso 25. Encontra-se a indicação de expressivo no início da melodia. Aos poucos vão se adicionando os timbres dos instrumentos de madeira e a nota do pedal dos violoncelos torna-se sincopada em contraste com o pizzicato dos contrabaixos. No compasso 33, os I Violinos surgem com um expressivo contraponto contrastando com o segundo tema dos II Violinos.
O tema do adagio - primeiro tema, sofre na seqüência cinco variações de ornamentos melódicos de complexidade crescente. Ao final do andante, compasso 42, volta ao tempo I, ou seja ao adagio, e é justamente a partir daí que se iniciam as 5 variações.
A primeira variação está na tonalidade de Si bemol e surge a partir do compasso 43 em compasso quaternário na parte do I Violino.
A segunda variação surge no compasso 83, apresentada pelos clarinetes e fagotes, na tonalidade de Mi bemol.
A terceira variação aparece no compasso 99, em Si bemol maior e no compasso quaternário composto 12/8, que é apresentada pelos I Violinos, acompanhados por toda a orquestra.
A quarta variação aparece no compasso 125, em Si bemol maior e ainda no compasso quaternário composto 12/8, que também é apresentada pelos I Violinos, acompanhados por toda a orquestra.
A quinta e última variação aparece no compasso 136, na tonalidade de Si bemol maior e no compasso quaternário composto 12/8, que é apresentada alternadamente entre as Flautas e os I Violinos. Esta variação tem dupla função, pois ela é tratada também como coda do terceiro movimento.

IV MOVIMENTO: "Presto"
A última parte da sinfonia não leva nenhuma indicação geral de tempo e "ataca" ao concluir o movimento anterior. Está composta por diversos movimentos e fragmentos que se sucedem sem solução de continuidade, formado por um preambulo 5 (cinco) variações, ao centro um Intermezzo lento, religioso, com uma nova idéia, derivada do tema principal, não sendo variação do mesmo e a Coda final.
Fica então assim:

Introdução dramática - "Presto" - recitativos - evocando os temas anteriores
Tema - Exposição orquestral e vocal (compasso 208)
I Variação - "Allegro assai vivace" - Marcha com Tenor e coro - (compasso 331)
II Variação - Fugato orquestral - (compasso 431)
III Variação - Coro - (compasso 541)
Intermezzo - "Andante maestoso" - Religioso para coro - (compasso 595)
IV Variação - "Allegro energico, sempre bem marcato" - coro - (compasso 655)
V Variação - "Allegro ma non tanto" - coro e quarteto de solistas - (compasso 761)
Coda - "Prestissimo" - coro (compasso 851)

O "Presto" está na tônica em ritmo ternário, serve de introdução ao final. A orquestra agrega um novo instrumento, o contrafagote. O caráter agitado é entrecortado por recitativos e indicações dos andamentos anteriores. Esta introdução, podemos dizer está no estilo fantasia, com um caráter dramático culminando com um duro acorde dissonante na orquestra (sexta de Re menor com apoggiatura).
Violoncellos e contrabaixos interrompem a massa sonora e entoam tema, em forma de recitativo. A partitura original indica este recitativo em francês "selon le caractère d'un récitatif, mais in tempo" - (com caráter de um recitativo, mas sempre a tempo). Em uma anotação de manuscrito, Beethoven, escreveu: "Ganz als ständen Worte darunter" (absolutamente como se houvesse palavras debaixo).
Novamente surge nova e tempestuosa massa sonora em um acorde de sétima diminuta em fortissimo.
Na seqüência do "Presto" surge uma mudança de andamento é um "Allegro, ma non troppo", onde há uma insinuação ao início da sinfonia, com os motivos do primeiro tema, com um pedal dos instrumentos de sopro. No compasso 38 volta o Tempo I por apenas 10 compassos. No compasso 48 surge um vivace em alusão ao segundo movimento, um "Scherzo" em estilo fugato sobre as madeiras, com acompanhamento das cordas em pizzicato de apenas 10 compassos. Na seqüência volta o Tempo I em um recitativo de apenas 7 compassos dos Violoncellos e dos Contrabaixos, sendo interrompido por um "Adagio cantabile" de apenas dois compassos surgindo novo recitativo dos Violoncellos e dos Contrabaixos em Tempo I. Allegro. No compasso 77 surge um "Allegro assai" em Re maior, sobre um pedal das trompas em La, onde anuncia-se o tema da alegria pelos instrumentos de sopro (oboé, clarinete e fagote). Por fim, encerrando o período introdutório, um novo recitativo dos Violoncellos e Contrabaixos, apoiados por acordes enérgicos dos instrumentos de sopro.
Compasso 92. Aqui começa um "ALLEGRO ASSAI" em Re maior. Neste movimento, começando pelos instrumentos de cordas graves, Violoncello e Contrabaixo, a orquestra expõe o tema da alegria, antes mesmo as vozes o fazerem.
A exposição do hino dura exatamente 24 compassos. Os primeiros 16 compassos formam a primeira estrofe com duas frases de 8 compassos cada. A meia frase conclusiva da segunda é o final da primeira. Em seguida se repete na íntegra toda a segunda frase por um período de 16 compassos, ouvindo-se a Viola em uníssono do Violoncello.
Surge novamente o "Presto". Esta intervenção do tutti da orquestra é ainda mais dissonante que a primeira provocada pela quadrupla apoggiatura (Si bemol, Do sustenido, Mi e Sol) sobre o acorde de sexta de Re menor.
Ao final destes 8 compassos surge a primeira intervenção da voz solista do Barítono, em forma de recitativo, como um resumo dos recitativos instrumentais anteriores, primeiramente "a cappella" depois com a intervenção das cordas.

ALLEGRO ASSAI. O tema principal, harmonizado como na primeira vez, reaparece nos instrumentos de sopro de madeira. O Barítono solista canta "Freude" e os baixos do coro respondem com a mesma palavra, tendo as cordas o acompanhamento em pizzicatto, apoiados no pedal das trompas. Nas Violas, Violoncellos e Contrabaixos, ouve-se o tema principal em uníssono à voz solista, sendo como acompanhamento um contraponto apresentado pelos Oboés e pelo Clarinete. A partir do compasso 241, a voz solista de Barítono canta o tema principal na sua íntegra, sobre os versos brilhantemente modelados com a música.
O solista Barítono fala o seguinte texto em alemão:


PRIMEIRA ESTROFE:
Freude, schöner Götterfunken,

Alegria, centelha de imortal chama,
Tochter aus Elysium
Filha de Eliseu
Wir betreten feuertrunken,
Ébrios de fogo, deusa celestial,
Himmlische, dein Heiligthum!
Invadimos teu santuário!
Deine Zauber binden wieder,
Deixa que tua magia reuna
Was die Mode streng gethaeilt;
Todos os que as leis da terra dividem;
Alle Menschen werden Brüder,
Todos os homens serão irmãos,
Wo dein sanfter Flügel weilt.
Sob tuas ternas e amplas asas.
_______________________________________________________________________
SEGUNDA ESTROFE:
Wen der grosse Wurf gelungen
Aquele que teve a boa sorte
eines Freundes Freund zu sein
De ser amigo de um amigo
wer ein holdes Weib errungen
Aquele que conquistou uma nobre mulher
Mische seinen Jubel ein!
Deixem-no associar-se ao nosso júbilo!
Ja, wer auch nur eine Seele
E também aquele que pode chamar sua
sein nennt auf dem Erdenrund!
Uma outra alma
Und wer's nie gekonnt, der stehle
Mas deixem também em isolado pranto
Weinwnd sich aus diesem Bund.
Quem jamais conseguiu tanto.

Os 16 primeiros compassos da segunda estrofe são cantados pelo quarteto solista, complementando os restantes 16 compassos da estrofe pelo coro. No compasso 296 inicia-se a terceira estrofe com o quarteto solista, agora em forma de uma sutil variação, igualmente seguindo-se o coro na segunda metade com a mesma idéia rítmica. Alguns timbres dos sopros de madeira duplicam as vozes.

TERCEIRA ESTROFE:
Freude trinken alle Wesen

Todo o ser vivente extrai
An den Brüsten der Natur;
Alegria do amplo seio da natureza;
Alle Guten, alle Bösen
Todos os bons homens e os maus também
Folgen ihrer Rosenspur.
Procuram-na em ansiada busca.
Küsse gab sie uns und Reben
E beijos e vinho ela oferece
Einen Freud, geprüft im Tod;
Aos que firmes, ficaram na morte;
Wollust ward dem Wurm gegeben,
O verme recebe a alegria da vida
Und der Cherub steht vor Gott.
E os anjos habitam com Deus!

I VARIAÇÃO - "Allegro assai vivace - alla marcia" - compasso 331
Após um longo silêncio, ouve-se um grave Si bemol, tocado pelos Fagotes e Contrafagote, em pianissimo e entrecortado acompanhado por golpes tênues do bombo. Na bateria, além do Bombo ouve-se o Triângulo e os Pratos.
O tema variado, dividido em duas partes, aparece no Flautim, Clarinetes e nas Trompas.
Ao concluir o período melódico intervém a voz humana - o Tenor
O Texto cantado pelo Tenor é o seguinte:

Froh, wie seine Sonnen fliegen
Alegres como sóis incandescentes
Durch des Himmels prächt'gen Plan,
Que cruzam, gloriosos, os espaços celestiais
Laufet, Brüder, eure Bahn,
Correi, irmãos, por vossos caminhos
Freudig, wie ein Held zum Siegen
Alegres como cavaleiros vitoriosos.

Na seqüência, o coro masculino confronta-se à voz do Tenor solo, com um acompanhamento orquestral em estilo de marcha turca, propiciando à voz do Tenor um sentido heróico.

II VARIAÇÃO - compasso 431
Este fragmento vai num crescendo constante culminando com um magnífico Fugato para orquestra, iniciando-se pelas cordas graves e fagotes, em contraste com o contratema dos II Violinos, Clarinetes e II Trompas. Estes dois elementos vão passando pelos diversos timbres e regiões da orquestra em estilo Fugato.
A tonalidade inicial é em Si bemol maior, passa por diversas outras tonalidades concluindo em Si menor. As madeiras e as trompas, a partir do compasso 516, apresentam-se em um pedal, em contraste com as cordas e Fagote que executam saltos sincopados de oitava A nota pedal prossegue nas trompas com seu ritmo sincopado, por vezes em Si Maior e por vezes em Si menor provocado pela interferência dos Oboés e Fagotes.

III VARIAÇÃO - compasso 543
Surge portanto, a III variação (letra "M" de ensaio), onde o coro explode proclamando o hino triunfal.
Os Trompetes e os Tímpanos marcam o vigor rítmico, modulando ao final para Sol maior, com brusca interrupção, seguida de longa pausa

INTERMEZZO - "Andante maestoso" - compasso 595
Um longo silêncio indica o início do Intermezzo, com grande solenidade religiosa no oitavo tom gregoriano. Ë um grande juramento de fraternidade e a afirmação da Fé em Deus.
Na primeira parte o coro canta o seguinte texto:

Seid umschungen, Millionen!
O amor se expande a milhões sem conta!
Diesen Kuss der ganzen Welt!
Lança um beijo ao mundo inteiro!
Brüder! Über'm Sternenzelt
Por cert, acima das estrelas do céu
Muss ein lieber Vater wohnen.
Um Pai bondoso tem sua morada.

O movimento inicia com uma mudança de compasso para 3/2 e a tonalidade vai para Sol Maior. As vozes masculinas, em uníssono, iniciam o movimento reforçadas pelo Trombone Baixo, Violoncellos e Contrabaixos, numa nova idéia extraída do tema que logo servirá de contratema. A melodia está no estilo de cantus firmus, de forma simples. Na seqüência, todo o coro repete a primeira parte de forma harmonizada.
Na letra "N", compasso 611 as vozes masculinas voltam a um novo uníssono, reforçados pelos Trombones, Violoncellos e Contrabaixos, seguindo-se novamente um coro harmonizado apoiado por uma orquestra em contraponto.
Na segunda parte surge uma nova indicação de movimento: "Adagio ma non troppo, ma divoto", um pouco mais lento que a parte anterior, onde sua robustez e desenvolvimento misterioso invoca a Fé.
A tonalidade passa a menor e as Violas se dividem. Considera-se um dos primeiros exemplos onde acontece este processo de divise.
Em seguida a uma série de acordes o coro canta:

Ihr stürzt nieder, Millionen?
Prostrai-vos ante Ele, milhões?
Ahnest du den Schöpfer, Welt?
Sentes, ó mundo, teu construtor?
Such'ihn über'm Sternenzelt!
Procura-o acima das estrelas do céu!
Über Sternen muss er wohnen.
Acima delas estão Seus pavilhões.

A orquestra está envolta em matizes e contrastes, acordes em fortissimo e em piano e a orquestra velada, como se fosse um órgão. O final todo o conjunto sonoro está em um largo pianissimo sobre a nona de dominante de Re.

IV VARIAÇÃO - "Allegro energico, sempre ben marcato" - compasso 655
A quarta variação é uma fuga dupla para coro e orquestra, renasce da Tônica em 6/4, movimento de grande dinamismo. Inicia com os Sopranos, Flautas e Oboés executam a primeira estrofe, em oposição aos Contraltos, Trompetes, Trombone e II Violinos com o tema de "Seid umschungen Millionen". Os I Violinos adornam o conjunto com rápidas passagens.

V VARIAÇÃO - "Allegro ma non tanto" - compasso 763
Depois da Fermata, sobre o acorde anterior, em pianissimo entre a última variação em compasso binário e na tonalidade principal. O tema é apresentado em ligeiras colcheias das cordas, retomadas pelas madeiras logo adiante em movimentos contrários.
Este movimento é para quarteto solista, coro e toda a orquestra. As partes vocais iniciam-se com as vozes solistas do Tenor e Baixo, logo sendo completado o quarteto pelas vozes femininas. As partes solistas cantam uma variante rítmica sobre um pedal das violas e da trompa.
O texto dos solistas é o mesmo de "Freude, Tochter aus Elysium!" Na seqüência segue uma outra variante dentro deste mesmo tema, que aparece na entrada do coro em uníssono "Deine Zauber" já apresentado pelos solistas no compasso 782, harmonizando-se em seguida sobre o texto "alle Menschen" em um explosivo fortissimo, que 4 compassos após diminui para um piano com igual mudança de andamento "Poco Adagio", destacando-se a linha melódica do soprano, que nos últimos dois compassos é ornada sendo seguida pelo contralto em seu desenho rítmico. A frase não é conclusiva interrompendo-se no acorde da dominante surgindo daí o "Tempo I" na orquestra, logo incorporando o coro. No compasso 827 o coro volta ao texto "alle Menschen", que é retomado pelo quarteto solista, de uma forma de cadência, mas logo interrompida por uma mudança brusca de andamento, voltando novamente a indicação de "Poco Adagio", com um mínimo de participação instrumental, tendo como função dar apenas apoio às vozes solistas, cujo frase é um intrínseco quádruplo contraponto, com vocalizes que se imitam entre as partes, modulando para Si Maior, embora o acorde conclusivo se transforma em menor. As passagens vocais são consideradas passagens de grande dificuldade e temida por muitos cantores, especialmente pelos registros agudos.
Ao final desta passagem dos solistas há uma nova mudança de tonalidade, passando para Re maior em compasso binário com a indicação "Poco Allegro, stringendo il tempo, sempre più Allegro" passagem esta em uníssono das cordas, sendo que nos 2 últimos compassos todos os sopros de madeira associam-se a esta passagem, culminando com o surgimento do novo andamento.

CODA FINAL - "Prestissimo" - compasso 851
A Coda final é dividida em três momentos distintos:

· "Prestissimo" - que é a primeira parte
· "Maestoso" - a segunda parte
· "Prestissimo" - a terceira e última parte

A Coda está na tonalidade principal de Re maior, concluindo a obra.
Ao afirmar-se a Tônica no tutti em uníssono nota-se a presença do Flautim e os Trombones, e a percussão reforça o impetuoso ritmo com a presença do Bombo, Triângulo e Pratos. Imediatamente após a entrada das cordas o coro em uníssono repete a frase e as madeiras realizam ligeiros contrapontos. O coro repete mais uma vez o texto "Seid umschungen". Antes da conclusão da primeira parte inicia-se um turbilhão de escalas ascendentes e o coro passa a cantar os versos de "Freude, schöner Götterfunken!", o qual se encaminha para o "Maestoso" de quatro compassos em 3/4, cujos acordes grandiosos são acompanhados por escalas das cordas, culminando com um fortissimo e uma retomada do "Prestissimo", com uma exclamação do coro sobre a palavra "Freude". O insistente acorde perfeito em Re Maior induz à conclusão, levado pelas madeiras a um movimento de escalas ascendentes, sobre um ritmo em sestinas dos Tímpanos e sobre 3 acordes em Re Maior das cordas e metais, assim toda a orquestra num só golpe seco encerra de forma magistral obra de Beethoven.
Do outro ponto de vista, podemos dizer que Beethoven reescreveu o texto de Schiller, utilizando apenas a metade das dezoito estrofes da versão de 1803, remanejando-as livremente de acordo com sua previsão poética.

Apollon Musagete – Curitiba, março 1995

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